sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

As greves e os cidadãos

Há uma pergunta que importa fazer. Qual a razão de haver tantas greves na função pública e tão poucas nas empresas privadas?

Quando falamos de greves na função pública estamos a falar de trabalhadores a quem podemos chamar, em sentido amplo, funcionários públicos e que são os que estão ao serviço dos cidadãos, através do Estado, das autarquias locais, das empresas públicas e, em geral, das muitas entidades públicas existentes. São mais de 700 mil trabalhadores, dos quais mais de 500.000 dependentes do Estado e de 200 mil dependentes das autarquias locais.

Será que estes trabalhadores ganham bem e têm carreiras motivadoras? A resposta, em geral é negativa. Nem ganham bem, nem têm motivação para fazer boa carreira na função pública. Todos têm razões de queixa

Assim sucede com os médicos e pessoal de saúde, desde os enfermeiros, aos técnicos, aos administrativos e todos aqueles que colocam o serviço de saúde a trabalhar. O mesmo ocorre com os professores de todos os graus de ensino e pessoal que contribui para que o serviço público de educação funcione. Do mesmo modo, os magistrados (embora estes aufiram remuneração especial), os funcionários judiciais, os agentes da polícia judiciária, os guardas prisionais, os polícias e outros que trabalham na área da justiça e da segurança. A lista seria muito extensa e é conhecida.

Mas se ganham mal e não têm motivação devem protestar e lutar pelos seus direitos. A pergunta é saber qual o meio mais indicado. A resposta mais natural é por todos conhecida. É a greve, porque as negociações não resultam.

Analisemos então a greve. A greve surgiu como forma de luta dos trabalhadores contra os patrões nas empresas privadas dada a exploração a que estavam sujeitos nas fábricas no início da revolução industrial. Através da greve obrigavam os patrões a negociar e a aceitar as suas reivindicações, pois doutro modo corriam o risco de não só terem graves prejuízos como abrirem falência. As greves prejudicavam principalmente os patrões.

Nessa altura, não eram permitidas, nem se falava sequer de greves na função pública. A sociedade foi evoluindo, o Estado aumentou o seu peso no mundo do trabalho e hoje temos a enorme quantidade de funcionários públicos de que acima falamos. Ao mesmo tempo, a greve passou a ser um direito dos funcionários públicos que hoje é utilizado com larga frequência como sabemos e sentimos.

Sentimos, porque ao contrário das greves nas empresas privadas que em regra atingem os patrões, salvo nos serviços essenciais como, por exemplo, os transportes, as greves na função pública atingem fundamentalmente os cidadãos. Assim sucede nos serviços públicos de saúde, de educação, de justiça, de segurança e de transporte.

É verdade que são também atingidos os governantes (seja o Governo propriamente dito, sejam as câmaras municipais), mas é preciso ter presente que os governantes não são patrões como os outros. O dinheiro que gerem não lhes pertence. É nosso e devem geri-lo do melhor modo, tendo em conta as nossas possibilidades orçamentais e a justiça. Não podem, por exemplo, aumentar a uns e não aumentar a outros. E o pior que lhe pode acontecer é cair, não é entrar em falência. Em falência entrará o país, se todas as reivindicações forem satisfeitas.

Por isso, em matéria de greves na função pública é preciso usá-las com todo o cuidado e só em última instância. Não é isso o que se verifica e algo está mal quando comparamos as greves na função pública com as das empresas privadas, algumas destas actuando nos mesmos domínios que as públicas. É preciso ter bem presente que os trabalhadores privados também ganham mal e milhões deles muito mal. Isso não dá que pensar quando falamos de greves?

(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho, de 20-01-2023)

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