Diz-se sem a devida reflexão, a meu ver, que as greves se fizeram
para causar danos e que quanto mais danos provocarem, nomeadamente aos
cidadãos, mais se afirma o valor da greve.
Precisamos de ir à origem das greves para verificar se assim é. Elas
surgiram com a Revolução Industrial, tendo a finalidade de defender os
direitos dos trabalhadores perante os patrões. Daqui resultava que a
greve atingia fundamentalmente os donos das empresas e o conflito
confinava-se ao círculo das empresas em causa.
Ora, o que se verifica hoje é bem diferente, pois as greves atingem,
não raras vezes, terceiros que não fazem parte do conflito, e antes são
nele envolvidos, ora pelos patrões, ora pelos trabalhadores para
alcançarem os seus fins.
Sucede, com cada vez mais frequência, nas complexas sociedades do
nosso tempo, que os cidadãos são jogados como “armas de arremesso” para
que as partes em conflito obtenham o que pretendem.
Essa situação não deve ser tolerada numa democracia.
Numa democracia, quando os cidadãos são envolvidos num conflito
laboral, sendo atingidos em direitos tão importantes, como, por exemplo,
o acesso a bens essenciais ou a saúde (lembre-se a greve cirúrgica dos
enfermeiros), passam a ter direitos.
Desde logo, têm o direito de obter uma informação detalhada sobre o
que está em causa no conflito laboral para saber as razões que assistem a
uma e outra partes.
Depois, têm o direito de exigir que sejam utilizados e esgotados
meios alternativos à greve para solucionar o conflito, de modo que esta
seja efetivamente o último recurso a ser usado.
Nos conflitos laborais, quer em geral, mas especialmente quando
estes possam atingir a generalidade dos cidadãos devem utilizar-se meios
de resolução, como a mediação e mesmo, sempre que possível, a
arbitragem.
E havendo necessidade de recorrer à greve, esta deve acautelar os
direitos fundamentais dos cidadãos, principalmente os direitos daqueles
que têm menos possibilidade de se defenderem. Normalmente, são os
cidadãos com menos recursos aqueles que mais sofrem.
Por isso é de exigir, em tais circunstâncias, que o Governo,
qualquer que ele seja, atue no sentido de proteger os cidadãos,
utilizando eficazmente os meios que têm ao seu dispor e que devem estar
previstos claramente na lei.
Não se trata de um direito do Governo, trata-se, em democracia, de um dever.
Nenhum trabalhador, como nenhum patrão, individualment e ou
organizados em sindicatos ou associações patronais, tem o direito de
violar direitos fundamentais dos cidadãos.
(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 9-8-2019)