sexta-feira, 23 de setembro de 2022

Ferrovia: a anormalidade de Ermesinde

A Ermesinde chegam comboios vindo do Alto Minho (até de Vigo), de Braga, de Guimarães e do Douro, pelo menos. São largas dezenas de comboios diariamente. Ora, tem algum sentido que, ao chegarem a Ermesinde e continuarem viagem para o Porto-Campanhã e daí diretamente ou com ligações para todo o país ferroviário, estes comboios tenham uma só linha? Sim, entre Ermesinde e Contumil há uma só linha no sentido Norte –Sul e outra no sentido inverso. Fácil é ver o engarrafamento que isto provoca nos cerca de sete quilómetros que separam Ermesinde de Contumil. Não se compreende. Os comboios chegam a Ermesinde e têm de esperar que haja linha para prosseguir viagem. Imagina-se facilmente a engenharia que é preciso fazer nos horários (diminuindo a velocidade) para que os comboios não fiquem em fila em Ermesinde.

A pergunta coloca-se: que fazem a Área Metropolitana do Porto e os demais municípios prejudicados por esta situação para pressionar o Governo e as infra-estruturas de Portugal para resolver este problema? Gastam-se milhões e milhões para alargar a linha do Metro e a obra está em andamento e não há alguns milhões para alargar a linha entre Ermesinde e Contumil?

Será preciso enumerar as vantagens dessa obra? Os passageiros que querem fazer o trajecto entre Porto e Ermesinde poderiam ter um comboio a eles dedicado com um horário adequado e paragem em todas as estações. Por outro lado, os passageiros que pretendessem vir (ou ir) do Alto Minho, Braga, Guimarães e Douro não teriam de parar nas estações intermédias (Águas Santas/Palmilheira, Rio Tinto e Contumil). E seria assim tão caro?

Esta situação mantêm-se porque os passageiros até Ermesinde têm comboios praticamente a toda a hora, ainda que apinhados e porque os passageiros que pretendessem ir mais além são resignados e não têm quem os defenda.

(Artigo de opinião publicado no Jornal de Notícias de 23-09-2022)

quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Já votei, mas...

Já votei, mas não gostei do modo como o fiz. Gostaria de ter na mão dois boletins de voto. Um para eleger uma pessoa devidamente identificada e outro para escolher o partido da minha preferência. Com o primeiro voto, daria um sinal da importância de ter como meu representante um candidato ou candidata de entre os vários que concorressem ao círculo determinado para a minha residência, com o qual mais me identificasse. Com o segundo, escolheria o partido da minha confiança e ao mesmo tempo contribuiria para eleger, de acordo com o método proporcional d’Hondt, os restantes representantes do círculo eleitoral plurinominal. Este segundo voto nunca seria perdido, pois contaria pelo menos para um círculo nacional. Atualmente votar num pequeno partido em círculos fora de Lisboa e Porto é um voto perdido.

Este modo de votação é permitido, desde 1997, pelo artigo 149.º da Constituição e não está em vigor entre nós, apenas porque ainda não houve um entendimento na Assembleia da República para alterar a atual lei eleitoral que claramente nos diminui como eleitores. Permite-nos apenas um voto pobre que não nos deixa escolher pessoas, mas apenas partidos que foram soberanos na escolha e ordenação dos candidatos.

Quando farão os partidos e, dentro deles, os dois maiores um acordo para dar cumprimento a essa possibilidade aberta pela Constituição? Tenho consciência de que tal só sucederá quando uma boa parte dos membros desses partidos levarem a sério o que possibilitaram na reforma de 1997. Mas, por outro lado, de que estão à espera para enriquecer o ato de votar aqueles que acreditam que é preciso modificar o nosso sistema eleitoral, tornando-o mais próximos e mais dependente dos cidadãos e não dos partidos? A luta cidadã pela modificação do sistema eleitoral deve começar, de novo, logo após estas eleições.

Pena é que não se faça também uma lei para concretizar o artigo 239.º, n.º 3 da Constituição , que possibilita, desde a revisão de 1997, a eleição dos vereadores das câmaras municipais pela assembleia municipal e estabelece obrigatoriamente que a moção de censura aprovada pela assembleia municipal tenha como efeito a queda da câmara e, já agora, da própria assembleia municipal, realizando-se novas eleições intercalares. São assuntos eleitorais que nem sequer precisam de revisão constitucional, basta apenas uma Assembleia da República mais próxima dos portugueses.
 
(Artigo de opinião publicado na edição online do Público, de 27-01-2022)